Os números envolvendo a produção de soja no Brasil são notáveis. Em 30 anos, a área plantada cresceu 200% e a produção, 500%. Cerca de 36 milhões de hectares estavam dedicados à sojicultura em 2019. O valor exportado em 2018 ultrapassou os 40 bilhões de dólares. Diante desses números excepcionais, pesquisadores do Cebrap Sustentabilidade e da Universidade Federal do ABC debruçaram-se sobre os estudos já realizados em torno do tema. E a conclusão a que eles chegaram foi a de que esses trabalhos, a despeito de sua inegável qualidade, tinham reduzido número de indicadores econômicos e sociais, focavam numa única localidade ou região e abordavam intervalos de tempo mais restritos.
Para superar essas limitações, os pesquisadores compreenderam que seria preciso combinar uma metodologia que pudesse abarcar o país inteiro durante décadas com estudos que incluíssem vários indicadores econômicos e sociais. E foi o que fizeram os autores dessa pesquisa, que abrange todo o território nacional num período de 30 anos.
Eles queriam compreender se os números da produção de soja efetivamente beneficiavam as regiões produtoras do país e suas populações. Queriam avaliar se os efeitos positivos compensavam as consequências negativas ao meio ambiente e ao uso da terra.
Intitulado “Campeões em produção, campeões em desenvolvimento?”, o trabalho foi apresentado ao público em webinário no YouTube do Cebrap. Os autores do trabalho (Arilson Favaretto, Louise Nakagawa, Lucas Silva, Thiago Morello e Bruna Fernandes) são pesquisadores do Cebrap Sustentabilidade e da Universidade Federal do ABC. A pesquisa contou com o apoio do Trade, Development & The Environment Hub (UNEP/WCMC), financiado pelo Global Challenges Research Fund (UK Research and Innovation). Assista aqui.
As três principais conclusões do estudo estão aqui resumidas:
- Os efeitos da produção de soja sobre um conjunto de indicadores socioeconômicos nas regiões produtoras não corroboram a narrativa de que os impactos ambientais negativos seriam compensados por efeitos positivos em indicadores econômicos e sociais. Existe uma heterogeneidade entre essas regiões, no que diz respeito aos indicadores de renda, pobreza e mortalidade infantil, analisados isoladamente.
- Em 54% dos municípios produtores de soja o desempenho dos indicadores socioeconômicos foi pior que a média do estado, em aproximadamente metade dos indicadores analisados. 33% dos municípios produtores de soja apresentaram desempenho inferior à média estadual, em pelo menos dois terços dos indicadores analisados. Apenas 21% dos municípios produtores de soja tiveram desempenho superior à média do estado, em pelo menos dois terços dos indicadores.
- Mesmo nos 20 municípios considerados campeões nacionais da produção agropecuária no ano de 2020, os números revelam um quadro contraditório. Em apenas três deles o desempenho observado é superior à média nacional em dois terços dos indicadores analisados. Quatro municípios estão no extremo oposto e apresentam desempenho inferior em dois terços ou mais dos indicadores analisados. Na maioria desses municípios, metade dos indicadores é superior à média nacional e a na outra metade, inferior.
O estudo agora divulgado aponta para a necessidade de aprofundar o entendimento sobre os efeitos territoriais da produção da soja, de abordar esses impactos de maneira multidimensional, abrangendo temas usuais como PIB e pobreza, mas também outros menos presentes nos estudos disponíveis como gênero, violência e segurança alimentar.
É importante também analisar os efeitos indiretos da produção da soja, como o deslocamento de atividades econômicas, e entre biomas, e os efeitos sobre a Amazônia da expansão da produção no Cerrado. Novos trabalhos, que abordam esses temas, já estão em fase conclusiva e serão em breve divulgados pelo Cebrap Sustentabilidade.
Entidades financiadoras e parceiras
O Global Challenges Research Fund é um programa do UK Research and Innovation, um órgão público do Reino Unido responsável por fomentar a pesquisa e a troca de conhecimento em instituições de ensino superior na Inglaterra. O GCRF é um programa voltado a apoiar pesquisas que visam a enfrentar os problemas de países em desenvolvimento.
O UKRI GCRF Trade, Development and the Environment Hub é um programa financiado pelo GCRF que tem como objetivos viabilizar e dar força ao comércio sustentável em todo o mundo. O TradeHub tem foco no comércio de alguns bens específicos com potencial de causar impactos na biodiversidade, como é o caso da soja.
Faça o download do estudo completo:
Confira os Working Papers:
https://cebrapsustentabilidade.org/assets/files/Cadernos_Cebrap_Sustentabilidade_n_4_2021.pdf
https://cebrapsustentabilidade.org/assets/files/Cadernos_Cebrap_Sustentabilidade_n_1_2022.pdf
https://cebrapsustentabilidade.org/assets/files/Cadernos_Cebrap_Sustentabilidade_n_2_2022.pdf
Trade Hub: https://tradehub.earth/