Com a palavra, Marcos Nobre, o novo presidente do Cebrap

O filósofo e professor da Unicamp Marcos Nobre é o décimo presidente do Cebrap. Frequentador da casa desde 1990 e co-fundador do Núcleo Direito e Democracia em 1999, Nobre começou sua gestão em 1º de junho e segue no cargo até maio de 2021 [com a possibilidade de renovação de mandato por mais dois anos, isto é, até 2023]. Na entrevista abaixo, o professor relembra seu início no Cebrap e reflete sobre os desafios de presidir uma instituição cinquentenária de pesquisa em ciências humanas.

Como você chegou ao Cebrap? O que fazia na época?
Em março de 1990, José Arthur Giannotti criou o grupo Lógica e Ontologia. Para compor o grupo, convidou seus próprios orientandos e orientandos de dois de seus ex-alunos, Luiz Henrique Lopes dos Santos e Ricardo Terra. Foi como orientando de mestrado de Ricardo Terra que me integrei ao grupo, que manteve seminários semanais até o ano 2000. Em maio deste mesmo ano fui contratado como professor de filosofia na Unicamp.

De lá pra cá em quais pesquisas participou e quais coordenou?
Em fevereiro de 1996, Giannotti me convidou para desenhar e coordenar uma pesquisa sobre meio ambiente. Tinha acabado de retornar de um estágio de pesquisa em Berlim, profundamente marcado pela questão ambiental – assim como pela questão do direito. Também durante esse estágio em Berlim conheci o sociólogo Sérgio Costa, que tinha acabado de defender seu doutorado e que tinha se tornado professor na UFSC. Convidei Sérgio Costa para dividir comigo a concepção e a coordenação da pesquisa, que passou a ter, assim, duas frentes. Ao final dessa pesquisa, fundei, com Ricardo Terra, em 1999, o Núcleo Direito e Democracia. Tivemos nosso primeiro Projeto Temático Fapesp aprovado no ano 2000, do qual fui pesquisador principal, com a responsabilidade de coordenar uma das suas duas linhas de pesquisa. Depois disso, fui coordenador de outros três Projetos Temáticos Fapesp.

Qual o papel do Cebrap na sua formação?
Faço parte de uma geração que experimentou a transição para uma universidade de especialidades e de especializações. Foi um processo que coincidiu com o declínio do modelo nacional-desenvolvimentista, em que a especialização fazia parte de um projeto de construção de país e, por isso mesmo, acontecia em ambiente interdisciplinar. Sem esse lastro e sem um substituto para ele, as especializações disciplinares se tornaram fins em si mesmos. O Cebrap me permitiu escapar o quanto possível dessa especialização predatória. Deu as condições para que eu pudesse desenvolver meu trabalho em ambiente efetivamente interdisciplinar, que é um requisito vital para quem, como eu, se filia à vertente intelectual da Teoria Crítica.

Marcos Nobre durante o seminário “Democracia à brasileira – Cebrap 50 anos” em maio deste ano

Como surgiu o convite para presidir o Cebrap e o que te levou a aceitá-lo?
São muitos anos de casa. Acho que o convite foi o resultado de uma convivência pessoal e acadêmica prazerosa e frutífera. A razão para aceitar, para além do desafio de dirigir um centro de pesquisa com a densidade histórica e teórica da envergadura do Cebrap: o momento vivido pelo país exige que ocupemos todos os espaços institucionais que pudermos para defender a democracia.

Quais os desafios de presidir uma instituição como o Cebrap?
O primeiro desafio é mantê-lo aberto. O momento não é favorável a um centro de pesquisa crítico que depende da captação de recursos de pesquisa para sobreviver. O segundo desafio é seguir a tradição da casa de inovar nos temas e nos métodos, de olho na produção dos mais complexos diagnósticos de tempo que pudermos produzir. O que inclui um radical movimento de autorreflexão: perguntarmo-nos, afinal, por que demoramos tanto para ver os movimentos tectônicos que estavam acontecendo na sociedade brasileira e global que vieram à tona nos últimos anos. Inovar exige também pensar os pontos cegos do próprio pensamento e da própria pesquisa.

O que esperar do Cebrap nos próximos anos?
Engajamento de corpo e alma na pesquisa de ponta e na defesa da institucionalidade democrática.

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