Nota do AFRO sobre a nomeação do presidente da Fundação Palmares

Nós, pesquisadores e professores do AFRO/Cebrap, vimos com espanto e indignação a nomeação de Sérgio Camargo para o cargo de presidente da Fundação Palmares. Como divulgado nos meios de comunicação nacionais, Sérgio Camargo não apresenta competência técnica nem conhecimento teórico e histórico do próprio órgão para o qual foi designado representante maior, tampouco representa os grupos e as organizações civis antirracistas que construíram esse espaço político ao longo das últimas décadas. Ademais, os discursos e as opiniões do atual presidente são radicalmente opostos à missão institucional da Fundação Cultural Palmares.

Criada pela Lei Federal nº 7.668, de 22 de agosto de 1988, a Fundação Cultural Palmares (FCP) foi o primeiro organismo do executivo federal a dedicar-se às demandas do movimento negro que reemergiu na cena pública brasileira no contexto das lutas contra a ditadura militar e em defesa democratização do Brasil. Sediada no então Ministério da Cultura, a referida fundação é fruto dessa mobilização política e cultural dos negros brasileiros, que no contexto do centenário da Abolição lutaram para que o símbolo da resistência à escravidão, o quilombo dos Palmares, fosse reconhecido no espaço de interação entre a sociedade civil e o Governo Federal. Desde então, pela presidência da Fundação Palmares passaram eminentes intelectuais e artistas negros, a exemplo de Joel Rufino, Dulce Pereira, Carlos Moura, Zulu Araújo, Hilton Cobra, Ubiratan Castro Araújo dentre outros. Das iniciativas da FCP, muitas delas dizem respeito ao combate ao racismo por meio da disseminação de informações históricas, de produções artísticas voltados para a valorização da história e cultura da população afro-brasileira.

A partir de meados da década de 1990 a FCP também teve papel fundamental ao promover os primeiros estudos histórico-antropológicos para o reconhecimento de comunidades quilombolas no país. Com o Decreto presidencial 4.887 de 2003, a FCP tornou-se responsável por emitir a certificação que consiste no primeiro passo do longo processo de regularização dos seus territórios. Até ontem, constavam no site da instituição os nomes de 3.386 comunidades quilombolas certificadas pela Fundação, além de 192 certificações em análise e 38 comunidades esperando a visita técnica do órgão. Infelizmente, ao final do mesmo dia em que foi anunciada a nomeação de Sérgio Camargo, o site da Fundação já não estava mais disponível, o que traz vivo temor sobre a segurança da grande massa de documentação acumulada pela instituição.

Por ser uma instituição histórica, de referência no combate ao racismo no Brasil e por desempenhar funções fundamentais para as populações negras, de terreiro e quilombolas, espera-se que o Presidente da Fundação Palmares possa ter, no mínimo, qualificações e conhecimento técnico e histórico do cargo que ocupa. Esse não é o caso do recém-nomeado Sérgio Camargo. Por esses motivos, este cargo não pode ser ocupado por alguém que recuse a agenda e que negue a importância da missão que dá nome à Fundação.

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