Estudo elaborado pela Universidade de Oxford (no Reino Unido) em parceria com as universidades federais de São Carlos (UFSCar), Pernambuco (UFPE), Minas Gerais (UFMG), e o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), apresenta que 43,9% dos jovens brasileiros, entre 16 e 26 anos, se declaram propensos a buscar carreiras militares. Crises e falta de oportunidades podem explicar resultados obtidos pela pesquisa.
Andreza Aruska de Souza Santos, da Oxford School of Global and Area Studies, conta que a motivação para realização do estudo veio do cenário de crescimento da presença militar na sociedade brasileira. Os pesquisadores registram, por exemplo, a existência de mais de 6.000 cargos comissionados no Governo Federal ocupados por militares em 2021 (18% do total), bem como o crescimento de candidaturas ao legislativo estadual e federal – de 786 para 1.199 entre 2018 e 2020. O aumento mais relevante, entretanto, ocorreu entre os deputados e senadores eleitos – de 14 para 76 no mesmo período (ou 442% a mais em 2020).
“Nas pesquisas que realizo, tive essa percepção de que, entre classes médias e médias baixas, a carreira militar estava se tornando uma opção importante. Encontrava, por exemplo, jovens que, em vez de buscar uma universidade, já começavam fazendo cursos preparatórios para as carreiras militares”, conta a pesquisadora. “Como o Gabriel Feltran trabalha com as periferias urbanas e em contextos relacionados à juventude, conversamos sobre o tema, e ele me disse que também estava vendo as forças armadas e as polícias se tornarem mais populares”, complementa, citando docente do Departamento de Sociologia da UFSCar que também integra o time de pesquisadores.
Para realização da pesquisa, foram aplicados – via Internet – questionários compostos por 58 itens, junto a 2.055 pessoas de todas as regiões brasileiras, em survey com intervalo de confiança de 95% e erro máximo de 2,2%. Essas questões são vinculadas a oito categorias de análise: propensão a buscar as carreiras militares; percepções sobre essas carreiras; associação a visões e atitudes conservadoras; habilidades e aspirações de trabalho; percepções do mercado de trabalho; perfil sociodemográfico; trajetória escolar e na carreira; e contexto familiar.
“De todas as condicionantes que poderiam explicar o interesse nas carreiras militares – como fatores ideológicos, questões materiais concretas, geracionais, gênero, raça, classe –, os resultados mostram claramente que a tendência a este interesse cresce conforme aumenta a vulnerabilidade dos jovens”, destaca Gabriel Feltran. “Apesar de um discurso do empreendedorismo que inunda o ambiente onde esses jovens circulam, que fomenta a iniciativa individual em oposição a empregos estáveis, eles estão fazendo escolhas bastante racionais, percebendo nas carreiras militares a possibilidade de estabilidade, de crescimento e, também, questões muito básicas, como a garantia de alimentação, em um país em que mais de 33 milhões de pessoas vivem em situação de insegurança alimentar”, complementa.
A pesquisa foi realizada entre outubro e novembro de 2021, com aplicação de 2.055 questionários junto a amostra representativa da população brasileira nesta faixa etária. Os resultados da pesquisa, bem como o detalhamento da metodologia empregada, estão publicados no artigo “Dataset on the perceptions of Brazilian youth toward a military career post-Covid-19”.